Você e seu dinheiro: como fazer esse relacionamento de longo prazo funcionar
agosto 31, 2020De zero a dez, o quanto você acredita que toma decisões financeiras de maneira racional? Pois saiba que nem você, nem ninguém, é muito racional quando o assunto é dinheiro.
Todas as nossas decisões são influenciadas por questões emocionais, e com o dinheiro não é diferente.
Gastar demais, perder o rumo do planejamento financeiro ou simplesmente não planejar e procrastinar indefinidamente esse momento de organização são comportamentos muito comuns.
O que acaba acontecendo é que a maioria das pessoas sente uma certa vergonha da sua vida financeira. Em grande parte dos casos, a relação com o dinheiro é conturbada, borrada, sem clareza e mal resolvida.
Para facilitar o seu entendimento, quero que você faça um exercício de reflexão: pense no seu dinheiro como se você tivesse com ele um relacionamento de longo prazo. Não como algo estático, como um pedaço de papel ou um número na sua conta bancária. Mas sim como algo dinâmico.
Seu dinheiro e suas finanças são uma espécie de entidade que você desafia e com a qual cria ou perde oportunidades, circula e interage.
Querendo ou não, você tem um relacionamento diário com essa entidade, tem sentimentos em relação a ela, e toma decisões sobre dinheiro o tempo inteiro.
Essas decisões afetam a sua situação financeira, e seus impactos afetam você, seus sentimentos e, em consequência, seus comportamentos futuros.
Veja bem, entenda que esse relacionamento é talvez um dos mais longos que você desenvolverá durante a sua vida. Um relacionamento diário, intenso e duradouro, mas que nem por isso precisa ser ruim!
Se você não começou bem esse relacionamento, não se preocupe: uma das grandes vantagens é que o dinheiro não guarda rancor.
Você pode ter tratado mal seu dinheiro até aqui, mas sempre é tempo de recomeçar. Fique atento: como em qualquer relacionamento, seus resultados vão depender da sua dedicação.
E para recomeçar sua relação com o dinheiro de maneira saudável, você precisa entender que suas emoções desempenham um papel muito importante em tudo isso.
Sua ansiedade e o fato de você, de forma inconsciente ou mesmo consciente, evitar o dinheiro, acabam criando um ciclo vicioso.
E, principalmente, saiba que esse relacionamento inclui os seus antepassados. No sentido psicológico, a herança que você construiu no seu processo de socialização econômica, na sua infância, afetam e continuarão a afetar seu relacionamento com o dinheiro.
Nesse relacionamento emocional com o dinheiro, todos nós desenvolvemos quatro emoções básicas: o medo, a culpa, a vergonha e a inveja. Acredite, nutrimos algum grau dessas emoções, mesmo que variem na intensidade e na frequência.
Temos medo de não ter dinheiro suficiente, medo de ser expostos, humilhados, e até mesmo o medo de provocar inveja nos outros.
Você pode se sentir culpado porque tem mais dinheiro do que outras pessoas da sua família ou mesmo do que seus amigos.
Já a vergonha, que eu mencionei no início do texto, é uma das emoções mais comuns e poderosas associadas ao dinheiro.
A vergonha costuma provocar o que, na psicologia do dinheiro, é chamado de “aversão ao dinheiro”, que acontece quando a pessoa acaba associando dinheiro a algo ruim e evita pensar em dinheiro, julga-se ignorante e incapaz sobre qualquer coisa relacionada a dinheiro.
Como pior consequência, essas crenças acabam impedindo que você não faça o que sabe que deveria fazer com o seu dinheiro. Basicamente, gastar menos do que ganha, poupar, formar uma reserva de emergência e investir no seu futuro.
Dinheiro sem tabu: descubra como suas crenças limitantes influenciam suas decisões – e saiba mudar isso
Quando você sente muita vergonha, naturalmente vai evitar encarar qualquer coisa que te deixe desconfortável. Só que que essa sua forma de agir vai te levar a ter ainda mais vergonha.
E aí você procrastina, deixa para depois esse ato de cuidar da sua situação financeira, e esse depois não chega. Até que, um belo dia, você vê aquela sua dívida de mil reais de alguns anos atrás se tornar R$ 30 mil!
Essa dinâmica do nosso cérebro é mais comum do que gostaríamos de pensar. Nós estamos meio que programados para realizar essas manobras de fuga quando encontramos alguma coisa nos provoque medo, ansiedade e desconforto.
Nosso cérebro sempre está buscando maximizar o prazer e minimizar a dor. Essa é uma característica evolutiva e o princípio do prazer e da dor está no cerne de todas as decisões que tomamos. Crenças, valores, ações e decisões são construídas sobre este princípio.
Mas evitar essa dor e evitar fazer o que é necessário, como organizar suas questões financeiras, só vai te causar ainda mais ansiedade.
Imagine a seguinte situação: você está seriamente pensando em dedicar sua tarde de domingo para examinar com bastante atenção sua situação financeira e criar um plano financeiro realista, tudo como deve ser.
Porém, só de pensar nessa cena, seus níveis de ansiedade começam a aumentar muito. Você começa a ter medo de não ser capaz de enfrentar algumas verdades.
Por exemplo, que você está chegando aos 40 e não conseguiu juntar nem perto do que você gostaria. Ou que não economizou o suficiente para pagar uma boa educação para os seus filhos.
E que aquele carro esportivo que você comprou em 2018, que a primeira parcela era “só em seis meses”, o IPVA do primeiro ano “totalmente grátis” e com parcelas “que cabem no seu bolso” é na verdade um gasto totalmente insustentável para o seu padrão de vida atual.
Pois é. Mas o que acaba acontecendo é que a ansiedade faz você procrastinar ainda mais. Aí você se deixa distrair com alguma outra coisa e seus níveis de ansiedade caem imediatamente, o que acaba causando em você uma sensação de bem-estar, o que te motiva ainda mais a evitar olhar sua situação financeira.
E qual a consequência disso? Você repete esse ciclo, infinitamente. Só que, infelizmente, no longo prazo, a coisa piora, e muito.
O seu nível geral de ansiedade vai aumentar cada vez mais. Vira uma bola de neve. Você acha que faz sentido continuar assim?
Agora imagine você enfrentando a realidade e se preparando para fazer o seu planejamento financeiro.
Sua ansiedade vai aumentar temporariamente sim, porém, se você encarar de vez e persistir na tarefa, seu nível geral de ansiedade diminuirá aos poucos.
Você vai tomando consciência e dando clareza para suas questões financeiras. Você entende o tamanho do problema e percebe, muitas das vezes, que afinal de contas ele não é tão ruim como você estava supondo. Ou que ele pode ser ruim, mas que é possível ser resolvido.
O autoconhecimento financeiro, no começo, pode causar incômodo, mas a realidade é sempre sua amiga.
Como em qualquer relacionamento, a clareza contribui muito para que os laços se fortaleçam. A clareza traz confiança, que é a base de um bom relacionamento.
Por isso, saber sua situação financeira hoje será o primeiro grande passo para uma relação mais saudável com o seu dinheiro. Acredite, é mais fácil do que você pensa.