Shopee diminui operações em países da América Latina, mas não no Brasil: o que isso indica para o e-commerce do país?
setembro 9, 2022
Em mais um movimento em busca de rentabilidade das companhias de e-commerce, a Shopee, braço de comércio eletrônico da Sea, informou aos funcionários na última quinta-feira (8) que estava reduzindo as operações no Chile, Colômbia e México e deixando a Argentina. A notícia foi veiculada pela Reuters, citando fontes, e confirmada por outros veículos durante a manhã.
A empresa com sede em Cingapura manterá operações internacionais nos três primeiros mercados, mas cortará a maioria de suas equipes nos países, afetando dezenas de funcionários.
O Brasil, por sua vez, não será afetado. Contudo, segundo informações do Valor, a empresa criou uma nova cobrança sobre a venda, válida desde o dia 1 deste mês, que elevou a taxa total cobrada dos parceiros que usam a plataforma para até 20%. O objetivo é melhorar os resultados da operação local. A empresa também criou uma norma para ocultar produtos de vendedores que atrasam entregas, numa tentativa de aprimorar o serviço.
Em e-mail interno visto pela Reuters, o presidente-executivo da Shopee, Chris Feng, escreveu aos funcionários que “à luz da atual incerteza macroeconômica elevada”, a empresa precisava “focar recursos nas operações principais” e decidiu se concentrar na Shopee México, Colômbia e Chile. A empresa confirmou em comunicado à Reuters que “se concentraria em um modelo transfronteiriço no México, Colômbia e Chile, e fecharia na Argentina”.
Os analistas do Itaú BBA destacam que, dado o aumento substancial no custo de capital, veem a Shopee focando sua
recursos nas operações principais e preservando a rentabilidade nessas regiões, especialmente dado que a sua “vaca leiteira”, Garena (provedora da Sea de plataforma de Internet para consumidores com base na Ásia), teve dificuldades nos últimos trimestres, com o lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda, na sigla em inglês) caindo 55% no segundo trimestre de 2022 na comparação anual.
O banco lembra que esta não é a primeira vez este ano que a Shopee interrompe uma operação em mercados não centrais, tendo saído da Índia e da França em março. “Embora o último anúncio sugira uma ambiente competitivo mais suave no Chile, Colômbia, México e Argentina, também poderia indicar que a Shopee está focando seus esforços no crescimento no Brasil. No entanto, o aumento das taxas no país poderia levar a uma posição menos competitiva para a Shopee no mercado brasileiro”, avalia o banco.
O Goldman Sachs também aponta que a medida está de acordo com a estratégia da empresa de reorientar seus esforços nos mercados principais priorizando lucratividade.
Embora a gestão não comente sobre seus planos regionais de longo prazo, os analistas acreditam que este movimento não
necessariamente descarta o potencial da Shopee entrar novamente nos mercados após uma melhoria no ambiente macro, dada a maior flexibilidade em termos de fluxo de caixa para o grupo e pelo fato de ela ter mantido suas operações transfronteiriças na maioria dos mercados.
“Ao manter essas operações, a companhia poderá construir relacionamentos com os compradores e, ao mesmo tempo, construir mais entendimento em torno de preferências e comportamentos locais, um movimento que acreditamos que seria crítico para eles decidirem retornar a esses mercados”, aponta.
O Morgan Stanley vê a iniciativa como positiva para a Shopee, reorientando os seus principais mercados. A expectativa é de pouco impacto no volume de vendas de mercadorias brutas (GMV, na sigla em inglês), mas com uma potencial economia de custos bastante sólida. Os analistas do banco esperam reaceleração do GMV no quarto trimestre deste ano e recuperação da lucratividade.
Olhando para as outras operadoras da América Latina, o Morgan vê a retração da Shopee em certos mercados como um incremento positivo para o Mercado Livre (MELI34), enquanto o risco de concorrência persiste no Brasil. Para o Mercado Livre, a base de GMV de 2021 esteve dividida entre 44% Brasil, 24% Argentina, 19% México e 12% em outros países (principalmente Chile e Colômbia).
“Dado o escopo pan-regional da empresa, vemos uma leitura positiva para MELI com a saída da Shopee na Argentina e sua mudança para operações exclusivamente transfronteiriças no México/Chile/Colômbia. Embora o ramp-up (início das operações) do Shopee nesses países tenha ocorrido mais cedo do que no Brasil, vemos o recuo ajudando a remover um risco competitivo de longo prazo para o MELI”, avalia o banco.
Olhando para o Brasil, o maior mercado de comércio eletrônico na região da América Latina e para Shopee, os analistas do Morgan continuam vendo as duas companhias como ganhadoras de participação de mercado.
No entanto, em meio a um cenário em que as operadoras sediadas no Brasil estão cada vez mais focadas nas margens e menos no crescimento, e também destacando o aumento pela Shopee das taxas cobradas aos parceiros no Brasil, o Morgan vê o ambiente operacional do e-commerce no Brasil como competitivo, mas mais racional.
Nos últimos meses, cabe ressaltar, com a maior inflação e desaceleração das vendas do e-commerce, as companhias (incluindo Mercado Livre) têm adotado medidas para aumentar a rentabilidade.
Algumas das medidas são o aumento dos valores mínimos de compras para obter frete grátis ou outros benefícios, reduzindo o peso das vendas com entrega gratuita.
Via (VIIA3) e Magalu (MGLU3), por sua vez, também aumentaram em meados do ano a taxa de comissão cobrada dos lojistas que vendem em seu marketplace, como forma de elevar a receita e melhorar a gestão dos seus fluxos de caixa.
Na ocasião da elevação das taxas de comissão por essas companhias, a Levante Ideias de Investimentos destacou que mesmo com a movimentação dos players do setor para mitigar os impactos da queda nas vendas on-line, um ponto de atenção é a forma como as companhias executarão esse trade-off, ou seja, o quanto tais medidas irão impactar as vendas, com a redução dos benefícios aos clientes e aos sellers de suas plataformas.
(com Reuters)
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