Como os gestores montaram suas carteiras para o primeiro turno e o que acreditam que pode acontecer com ações e dólar no “day after”
outubro 1, 2022A incerteza sobre o resultado do primeiro turno da eleição presidencial, que será realizado neste domingo (2), e as divergentes visões econômicas dos candidatos levaram alguns gestores de recursos a mudar a posição das suas carteiras de investimento nas últimas semanas.
Uma pesquisa da BGC Liquidez ouviu 212 investidores institucionais que operam no Brasil para entender como eles enxergam que o mercado reagirá, na próxima segunda, aos possíveis resultados para o cargo de presidente da República.
A maior parte dos investidores (57%) acredita que a eleição deve ir ao segundo turno com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na frente. Já outros 20% acreditam que o presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, pode ir para o segundo turno com votação superior à de Lula.
Para a maioria dos gestores, o que está precificado, atualmente, tanto no Ibovespa quanto no dólar, é uma ida ao segundo turno com Lula na frente. Se for esse o cenário, tanto o índice da bolsa brasileira quanto a moeda americana, na próxima segunda-feira, não deverão sofrer fortes oscilações em consequência das eleições.
Vitória de Lula no primeiro turno pesaria sobre Bolsa
No caso de Lula ser eleito no primeiro turno, porém, a maior parte dos investidores acredita que possa haver uma queda de 3% a 5% do Ibovespa na segunda-feira (3). O dólar, por sua vez, poderia subir de 2% a 3% em relação ao real.
“O cenário se agravaria no caso de o Lula levar o cargo no primeiro turno. Se ele for eleito de forma direta no próximo domingo (2), terá maior poder de barganha para implementar suas políticas fiscais e de renda, aumentando certos riscos econômicos. Aí as quedas devem ser maiores”, contextualiza Juliano Ferreira, estrategista macro da BGC Liquidez.
Na última pesquisa DataFolha, publicada na quinta-feira (29), o ex-presidente Lula aparece com 50% dos votos válidos, com margem de erro de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos.
“Nem em 2006, quando Lula tinha aprovação recorde, ele levou as eleições no primeiro turno. Politicamente falando, chegaria com mais força para colocar as políticas econômicas que quisesse. É algo muito emblemático”, explica Ferreira.
O temor de parte do mercado é de que Lula, numa eventual eleição em primeiro turno, ganhe força para passar medidas econômicas mais heterodoxas, que envolvem mais gastos públicos e menor responsabilidade fiscal.
Empresas como a Petrobras e o Banco do Brasil (BB) também seriam impactadas. Isso porque Lula vem defendendo intervenções nas duas estatais, com medidas que podem reduzir o lucro. Quanto à petroleira, o petista já falou em acabar com a política de preços que segue a paridade de preço internacional e também indicou que quer investir em refinarias. Em relação ao BB, Lula defendeu que a instituição financeira vise menos ao lucro por ter responsabilidades sociais.
Em um cenário de vitória do petista no primeiro turno, os gestores que responderam à pesquisa da BGC Liquidez indicam que as ações preferenciais da Petrobras (PETR4) poderiam cair, na média, 6,6%. As ordinárias do Banco do Brasil (BBAS3), no mesmo parâmetro, recuariam 5,7%.
Gestores se posicionam para as eleições e diminuem exposição ao Banco do Brasil e à Petrobras
Com as incertezas envolvendo a Petrobras e o Banco do Brasil, gestores reduziram suas posições nas duas estatais.
“Para a eleição, o que fizemos foi aproveitar a forte alta que o Banco do Brasil teve no ano para zerar a exposição no papel. O banco estava sendo negociado a um múltiplo acima de 0,8 o book value [valor contábil de acordo com o balanço da companhia] e nós zeramos nossa posição”, abre Daniel Saraiva, chefe de renda variável da Compass Group. “Nós não temos Petrobras, preferimos ficar de fora. Achamos que as juniors oils têm uma assimetria interessante e sem o risco político. A verdade é que, para as empresas estatais, a vitória do PT não me parece boa para os fundamentos das companhias, por tudo que aconteceu no passado e também pelos discursos recentes do Lula.”
Ricardo Campos, diretor executivo da Reach Capital, tem opinião semelhante. “Ações como a Petrobras e o Banco do Brasil podem sofrer um pouco mais caso um candidato ou outro se destaque no primeiro turno”, comenta.
Nos últimos 30 dias, enquanto o Ibovespa acumula queda de cerca de 0,30%, as ações preferenciais da Petrobras caíram quase 12% e as ordinárias do Banco do Brasil, 9%.
No cenário macro, cautela também é palavra-chave
Para além das estatais, gestores também optaram por diminuir suas exposições aos ativos brasileiros de maneira geral.
“No Brasil, achamos que há muita incerteza na mesa quanto às eleições. No médio prazo, por conta da pauta exportadora e do patamar de juros, pode haver uma atração do investidor estrangeiro, mas achamos que há um desafio do lado fiscal, seja qual for o resultado da eleição. Queremos esperar um pouco para ver as sinalizações do próximo governo em relação a questões econômicas”, destaca Sérgio Zanini, sócio e gestor da Galápagos Capital.
Segundo ele, a visão da Galápagos é de que, apesar de a bolsa brasileira estar barata e haver prêmios na curva de juros, ainda há riscos na mesa. “Nossa exposição em Brasil, por enquanto, é pequena. Preferimos ficar de fora neste momento”, diz Zanini. “O plano de fundo para o cenário global também é muito negativo e nossas exposições são mais no sentido de ficar vendidos em bolsa, tomados em juros e comprados um pouco em dólar”.
Saraiva, da Compass Group, diz que também alterou sua estratégia na Bolsa. “Diminuímos o direcional do fundo [diminuição das exposição em ações compradas e vendidas] após a alta dos últimos dois meses, apesar de ainda acharmos o valuation da Bolsa brasileira atrativo. Optamos por ter um net long [posições compradas] menor. Mantivemos papéis considerados mais defensivos ou que vemos uma possibilidade de queda bem limitado”, afirma o gestor. “Obviamente que essa diminuição não vem só pela eleição no Brasil. A situação lá fora está bem complexa.”
Ele afirma que caso o cenário externo estivesse melhor, estaria aumentando a exposição no Brasil independentemente das eleições.
“Tudo bem, o Lula pode acabar com o teto de gastos, mas, ao mesmo tempo, deve trazer alguma âncora fiscal. Provavelmente vai colocar um político como ministro da fazenda, mas com uma boa equipe econômica assessorando”, explica o especialista da Compass. “Um cenário de upside [com potencial de alta] seria termos, no caso de eleição do Lula, uma pessoa como o Henrique Meirelles na Economia. Cenário downside [com potencial de baixa], que não é base, é um sem âncora fiscal e um político como ministro da Economia sem histórico de políticas fiscais responsáveis.”
Para ele, mesmo com uma vitória do ex-presidente petista, a tendência é um cenário base mais para o positivo do que para o negativo (excluindo os fatores externos).
Na pesquisa da BGC Liquidez, 78% dos gestores responderam que Lula deverá indicar para o Ministério da Economia alguém com maior tendência à esquerda, mas com nomes amigáveis ao mercado em sua equipe. Outros 12% acreditam que o petista irá indicar alguém pró-mercado de forma direta. Para 10%, o Brasil terá um ministro de esquerda.
Entre os possíveis nomes para o Ministério da Economia, 16% dos gestores acreditam que Henrique Meirelles pode ser o líder do Ministério da Economia em 2023; 8% veem Alexandre Padilha ocupando o cargo e outros 8% apostam em Fernando Haddad.
“Temos uma proteção natural, que é o Congresso, e que dificilmente será mais de esquerda, mas sim de centro-direita. Essa instituição deve segurar o ímpeto do Lula em algumas políticas econômicas consideradas mais heterodoxas, como um aumento exagerado dos gastos fiscais”, defende Saraiva. “Se formos para o segundo turno e o Bolsonaro ganhar força, fará ainda mais sentido o Lula anunciar um nome pró-mercado para ganhar a disputa. Com a diferença atual, mostrada nas pesquisas, porém, ainda não há esse interesse. De qualquer forma, esperamos um discurso de neutro para positivo no caso de uma vitória do Lula”, finaliza.