Berkshire Hathaway, de Warren Buffett, pode deixar de ser a empresa mais lucrativa dos EUA?

Berkshire Hathaway, de Warren Buffett, pode deixar de ser a empresa mais lucrativa dos EUA?

julho 25, 2020 Off Por JJ

Warren Buffett

SÃO PAULO — A empresa mais lucrativa dos EUA é de longe a Berkshire Hathaway, o conglomerado de seguros administrado pelo bilionário Warren Buffett. Com mais de US$ 80 bilhões em ganhos em 2019, a Berkshire é mais lucrativa do que qualquer empresa em todo o mundo, exceto a gigante petrolífera Saudi Aramco.

De acordo com a lista Fortune 500 de 2020, que compila o último balanço anual fechado das empresas, a Apple aparece em segundo lugar entre as americanas mais lucrativas, com ganho de pouco mais de US$ 55 bilhões no ano passado. Mas esse ranking deve mudar bastante na versão do ano que vem, quando serão levados em conta o desempenho das empresas em 2020.

A avaliação é de especialistas ouvidos pelo InfoMoney. Isso porque muitas gigantes têm sofrido em 2020 por causa da pandemia de coronavírus. A própria Berkshire registrou prejuízo de quase US$ 50 bilhões entre janeiro e março deste ano — sendo que o pior da crise é esperado pelos analistas para os números do segundo trimestre, que estão sendo divulgados agora.

Enquanto isso, empresas do setor de tecnologia passam por um bom momento, seja pela melhora nas linhas de seus balanços ou — principalmente — pela disparada de suas ações. Este é um setor que foi altamente beneficiado pelo “novo normal”, onde as pessoas estão trabalhando de casa em boa parte do mundo.

A terceira empresa mais lucrativa dos EUA é a Microsoft, que ganhou US$ 39,2 bilhões em 2019. Neste ano, mesmo em meio à pandemia, a companhia registrou crescimento de 22% no terceiro trimestre fiscal, para US$ 10,75 bilhões, mostrando que algumas de suas operações foram até beneficiadas pela pandemia de Covid-19, como os negócios de computação em nuvem.

“2020 vai ser um ano muito atípico para esse ranking. Acho que a Berkshire vai de fato cair. Ela teve um prejuízo que vai ser difícil de recuperar no ano”, disse Norberto Zaiet, ex-CEO do Banco Pine, sócio e gestor da Picea Investors, gestora focada no mercado de ações dos EUA.

Para Zaiet, alguns pontos no balanço da Berkshire podem, no entanto, ajudar a amenizar o impacto negativo da crise. “Tem a GEICO, uma seguradora de carros controlada pelo grupo. Todo mundo parou de usar carro na pandemia ou reduziu drasticamente o seu uso, então o volume de sinistros caiu, o que é bom para as seguradoras”, disse.

“Além disso, o mercado de ações se recuperou depois de março, e a Berkshire tem muitas ações de empresas importantes, como as da própria Apple. O fato de a empresa de Buffett ter se desfeito dos negócios no setor aéreo antes da crise também foi ótimo, pois impediu que o prejuízo do grupo fosse ainda maior”, completou.

Mesmo vendo chances de a Berkshire perder o posto de empresa mais lucrativa dos EUA, o gestor acredita que isso deve ser algo temporário e que a companhia continua sendo uma boa opção no médio e longo prazos.

“É uma ação que sempre desempenhou bem. A empresa tem estabilidade de lucro operacional, paga dividendos. É uma ação de value investing. Se analisarmos o desempenho da Berkshire nos últimos cinco, dez anos contra o desempenho do S&P 500 no mesmo período, vamos ver que o da companhia é muito melhor”, concluiu.

Sobre as empresas de tecnologia, Zaiet afirmou que o cenário atual é de fato bastante favorável para elas, mas que o mercado também tende a exagerar em suas reações. “O mercado jogou os preços desses papéis lá para cima, prevendo o pior cenário, de que nós nunca mais voltaríamos à vida normal. Mas quando isso tudo passar, as pessoas vão voltar a fazer algumas compras em lojas físicas, a viver como antes.”

Ele citou o caso da Amazon que, mesmo tendo visto um aumento recente no lucro, está sobrevalorizada na bolsa, com um múltiplo P/L (preço/lucro) de 150-160 vezes. A empresa de comércio online teve lucro de US$ 11,6 bilhões em 2019, bem abaixo de outras gigantes da tecnologia, segundo a Fortune 500, como o Facebook (US$ 18,5 bilhões) e a Alphabet (US$ 34,3 bilhões), que é a dona do Google.

Zaiet disse ainda que, além da Berkshire, empresas de outros segmentos também prejudicados pela pandemia de coronavírus vão perder espaço no ranking das mais lucrativas nos EUA este ano para algumas companhias de tecnologia. Os bancos estão nesse pacote, a exemplo do JP Morgan, que estava em quarto lugar no ano passado, com lucro de US$ 36,4 bilhões. Este ano, somente no primeiro trimestre, o lucro do banco caiu 68,7%, para US$ 2,87 bilhões.

Buffett x FAANG

Na visão de Guilherme Giserman, estrategista internacional da XP Investimentos, a permanência da Berkshire como empresa mais lucrativa dos EUA vai depender de como Buffett vai administrar os investimentos da empresa daqui para frente. Ele citou que já houve uma mudança de postura importante do “oráculo de Omaha” sobre as companhias de tecnologia.

“Ele não investia nesse setor. Não gostava das ações de tecnologia. Isso foi bom no passado, porque ele não foi prejudicado na bolha da internet, conhecida como bolha ponto com, no início dos anos 2000, quando os preços das ações de tecnologia explodiram. Mas hoje o cenário é diferente, já que essas empresas de tecnologia dão lucros altos”, disse.

“De lá para cá, o Buffett percebeu a força das tecs e entrou pesadamente através da Berkshire nas ações da Apple, por exemplo, que representam boa parte do portfólio de ativos do conglomerado hoje”, completou o estrategista. A Berkshire anunciou em 2016 que havia comprado pela primeira vez as ações da Apple — um investimento de US$ 1 bilhão na época.

“Acho que num futuro próximo não vai ter setor de tecnologia, tudo vai ser tecnologia. A Nike, por exemplo, fez uma transição muito positiva para comércio eletrônico e está indo muito bem. A Comcast deixou de priorizar as linhas de telefone para focar nos planos de dados, e tem se dado bem. A própria Disney lançou a Disney Plus e bateu todos os recordes de usuários”, comentou Giserman.

O estrategista da XP citou o sucesso das FAANG — sigla criada para definir o grupo formado pelas empresas Facebook, Amazon, Apple, Netflix e Google —, que hoje representam um quarto do S&P 500 em valor de mercado. “São maiores do que o PIB da América Latina”, disse.

“Elas dão lucro e vão continuar crescendo. Elas têm posição para crescimento orgânico e inorgânico. Elas têm US$ 500 bilhões em caixa, uma pilha enorme de dinheiro para fazer aquisições. Lembra quando o Facebook comprou o Instagram por US$ 1 bilhão? Hoje ele vale US$ 180 bilhões. Se Buffett ficar parado, elas vão ultrapassar a Berkshire com certeza. Isso só depende dele”, concluiu o estrategista.

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