Medicina de ponta, aço, carros inteligentes: veja como 5G já é usado por empresas no país
julho 31, 2022A internet 5G ainda nem chegou para a maioria dos brasileiros, mas as empresas já fizeram uma série de testes e têm projetos no país que vão da indústria à medicina. Enquanto o 4G trouxe maiores velocidades para o usuário de smartphones, viabilizando aplicativos como Uber, Waze e YouTube, o 5G deve melhorar essa experiência para o consumidor, mas o efeito maior será para as empresas.
O 5G permitirá a conexão de centenas de dispositivos em uma única rede e trará vantagens como estabilidade de sinal, alta velocidade de transmissão de dados e uma experiência de uso sem atraso entre o envio e o recebimento de comandos via internet.
Confira, a seguir, como as empresas brasileiras estão adotando o 5G:
Aumento de produtividade
Em busca de modernizar sua operação e aumentar a produtividade, a Gerdau fechou acordo com a Embratel para implementar uma rede 5G privativa na sua planta industrial de Ouro Branco, em Minas Gerais. A rede levará conexão de internet estável e livre de cabos aos 8,3 milhões de metros quadrados da produtora de aço.
O projeto será de longo prazo e começará a funcionar ainda no 4G, para evoluir ao 5G da Claro na frequência 3,5 GHz na segunda etapa de implementação. Nessa frequência, não só se torna possível uma redução drástica na velocidade entre envio e recebimento de comandos via internet, como também amplia-se a velocidade e o volume de dados que podem ser transmitidos e recebidos em tempo real.
O plano da Gerdau é utilizar o 5G para investir em equipamentos inteligentes, incluindo veículos que podem ser operados à distância ou tenham condução autônoma. Além disso, aparelhos podem utilizar recursos de inteligência artificial que estão distantes. Ou seja, não é necessário ter um dispositivo com configuração de ponta, desde que ele tenha acesso a um servidor com velocidade o suficiente para que seu funcionamento seja em tempo real.
Esse pode ser, por exemplo, o caso de câmeras de monitoramento, que detectam problemas de segurança na operação e interrompem o processo industrial automaticamente quando uma pessoa não autorizada entra em uma zona proibida ou quando um colaborador não estiver usando o equipamento de proteção necessário.
Na terceira e última fase do projeto com a Embratel, a rede privativa da Gerdau combinará o 4G com o 5G para oferecer uma velocidade de 4,8 Gbps, ante 256 Mbps da primeira etapa com o 4G.
“Com essa estrutura, poderemos oferecer mais capacidade conforme a necessidade da empresa, seja para automatizar máquinas e locomotivas, identificar pessoas com tags ou utilizar óculos de realidade aumentada. Ou seja, poderemos levar internet a qualquer ponto que tenha automação na operação”, conta Alexandre Gomes, diretor de marketing para empresas na Embratel.
A chegada do 5G à unidade de Ouro Branco é o primeiro passo da Gerdau para uma nova etapa de digitalização, que começou em 2014. De agora em diante, a empresa já não vê mais uma distinção entre investimentos em tecnologia e em ampliação dos negócios.
Para Franca, o plano é transformar a planta em uma fábrica inteligente. “O 5G não será uma plataforma de conectividade, mas, sim, de negócios para aumentar a eficiência da planta, conectando pessoas, máquinas e processos”, afirma. “Queremos ser mais competitivos no nosso contexto de negócios. Assim como o 5G, todas as inovações tecnológicas estão inseridas nesse cenário.”
Medicina de ponta em regiões remotas
O Núcleo de Inovação Tecnológica do Hospital das Clínicas FMUSP (InovaHC) está entre os primeiros do país a fazer testes de uso do 5G na medicina. Médicos e professores de medicina se uniram para elaborar uma lista de casos de uso nos quais o atendimento médico mais se beneficiaria da nova internet móvel.
O primeiro teste de transmissão de imagens de ultrassom em tempo real começou em meados de março deste ano. A proposta é simples: conectar médicos e especialistas de diferentes áreas. Eventualmente, pode se tornar possível até mesmo a realização do ultrassom pré-natal em cidades que não têm um médico alocado fisicamente no hospital, mas que acompanha tudo remotamente, e em tempo real. Outras aplicações do 5G que estão no radar são para exames como endoscopia e raio-x.
O InovaHC utiliza experimentalmente a tecnologia 5G de duas formas diferentes. A primeira é em parceria com a Claro e a Ericsson para conectar equipamentos médicos. A segunda, mais avançada, é a criação de uma rede privada de 5G própria, sem intermédio de operadoras de telefonia, junto a parceiros como Siemens, Deloitte, Itaú e NEC, além do auxílio da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e do acompanhamento do governo, por meio da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial.
“Temos a ideia de que o 5G, com maior velocidade, estabilidade de sinal e menor latência, será um desbloqueador de serviços médicos por meio da conectividade. A expectativa é levar acesso de qualidade à Medicina e com um custo mais acessível. Montar um hospital especializado em uma cidade pequena pode ser difícil, e o 5G pode ajudar a melhorar diagnósticos e triagens com serviços remotos”, conta Marco Bego, diretor de inovação do HC.
Em uma etapa futura, Bego espera que cirurgias robóticas possam ser realizadas a distância, sempre com um médico no comando, recebendo a assistência de um robô. Para Eduardo Polidoro, diretor de internet das coisas da Claro, essa é uma das aplicações em que o 5G se mostra superior ao 4G. “As cirurgias remotas poderão ser viabilizadas pela robustez e confiabilidade das redes 5G”, diz.
Como próxima fase dos testes, ainda neste ano, o InovaHC vai avaliar a possibilidade de transmissão de imagens de exames a uma cidade próxima no Estado de São Paulo. Posteriormente, o teste será ampliado a municípios mais distantes, abrindo o caminho para levar a medicina às regiões mais remotas do país.
Redução de acidentes
Em Jaraguá do Sul, no estado de Santa Catarina, a multinacional brasileira fabricante de equipamentos elétricos WEG começou a fazer testes com a internet 5G ainda no final do ano de 2020.
De lá para cá, a empresa avaliou tanto os resultados práticos da adoção da conectividade oferecida pela operadora de telefonia Claro quanto de uma rede privativa. A operação da fábrica com o 5G vem reduzindo custos com eletrônicos conectados à rede, bem como o número de acidentes e atrasos de produção.
“A aplicação do 5G na WEG é voltada à indústria que poderia ser replicada em outras empresas. Foram testados alguns casos de uso, como robôs de transporte, seja de peças ou produtos. O 5G faz bastante diferença porque permite ao robô tomar decisões por conta própria, com base em informações captadas no ambiente. Quanto mais processamento autônomo, mais caro ele seria por unidade. Quando compartilhamos a capacidade de processamento de vários robôs com a latência baixa do 5G, mantemos a operação autônoma, mas com o custo mais reduzido”, diz Eduardo Polidoro, diretor de internet das coisas da Claro.
Com os testes já realizados, a WEG conseguiu criar uma solução de implementação de internet 5G que já vende ao mercado, personalizada sob demanda. A empresa realiza o mapeamento da área, faz a conversão de tecnologias de conectividade antigas e instala antenas e o computador central que é responsável pela rede.
Carlos Grillo, diretor de negócios digitais na WEG, afirma que o 5G tem aplicações nítidas em aparelhos móveis que precisam de comunicação veloz com a internet. Esse é o caso de veículos de transporte autônomos, que andam por uma fábrica, levando peças de um lugar ao outro — como os que existem na própria WEG.
Apesar da inovação trazida pela tecnologia, Grillo pondera que ainda existem desafios a serem vencidos, como o custo associado aos produtos com 5G, o desenvolvimento de uma rede aberta que não dependa de fornecedores de infraestrutura de tecnologia e a adoção massiva dessa conectividade, uma vez que é com grande volume de aplicações que o 5G se diferencia mais do 4G e do Wi-Fi.
“O 5G industrial ainda está na primeira infância. Com os testes, tivemos muitos aprendizados e conseguimos desenvolver alguns produtos. O mercado sente que está muito no início, mesmo com os benefícios que o 5G traz”, afirma Grillo.
Monitoramento de fábrica
A fabricante chinesa Huawei já utiliza a tecnologia 5G na fábrica de Jundiaí (SP) desde março deste ano. A principal aplicação é levar internet para uma área de 30 mil m², o que acontece por meio de 14 antenas 5G, que substituíram estruturas físicas de cabeamento no local.
Na unidade, são produzidas placas processadoras e controladoras, assim como rádios-base. Os ganhos associados à produtividade vindos do 5G vêm do uso de câmeras com inteligência artificial para monitorar a produção, garantindo a segurança dos colaboradores.
Elas são capazes de detectar, em tempo real, erros na linha de montagem, assim como a presença de pessoas não autorizadas na área ou que não estejam utilizando os equipamentos de proteção necessários. Além disso, a Huawei fornece a alguns colaboradores óculos de realidade aumentada, que adicionam uma camada digital sobre a visualização do mundo real, trazendo informações que facilitam a manutenção de equipamentos.
Alex Salgado, vice-presidente B2B da Vivo, operadora que é parceira da Huawei no projeto, conta que o desafio associado à implementação da rede 5G é ligada à infraestrutura. “São necessárias quase quatro vezes mais antenas de 5G para ter a mesma cobertura do 4G”, diz. Porém, o executivo afirma que a demanda vinda de empresas indica que a adoção será mais rápida do que a vista no 4G. “Já temos mais de 20 projetos com empresas”, diz.
Em Sorocaba (SP), a Huawei mantém um centro logístico de 22 mil m² que conta com a cobertura da rede 5G. O espaço tem 12 antenas que permitem a conexão de até 300 aparelhos simultaneamente. Por causa disso, a empresa consegue agora utilizar robôs autônomos para transportar matéria-prima e equipamentos eletrônicos. De acordo com a companhia, o uso dessas tecnologias trouxe um ganho de 25% na eficiência da operação. Além disso, houve uma redução no ciclo de produção, que passou de 17 para 7 horas.
Identificação de modelos de automóvel
Em projeto feito junto com a operadora TIM e a consultoria Accenture, a Stellantis foi a primeira montadora do país a realizar um teste da tecnologia 5G na indústria automobilística.
No polo automotivo localizado em Goiana, em Pernambuco, a empresa fez testes para assegurar a identificação dos veículos, de acordo com suas versões e acessórios, o que trouxe ganhos de qualidade nos processos de montagem.
“Escolhemos o 5G por acreditar que esta é uma tecnologia não só aplicada ao mundo industrial, mas em outras vertentes também. Com isso, a empresa precisava começar a experimentar e testar a tecnologia para entender de que maneira o 5G poderia contribuir nos processos da empresa”, diz André Souza, diretor de tecnologia e software para veículos da Stellantis na América do Sul.
A identificação das mais de 100 versões dos quatro veículos produzidos na planta da Stellantis é feita por meio do monitoramento em vídeo automatizado, que é transmitido via internet 5G para uma central de processamento de dados. A baixa latência, velocidade entre envio e recebimento de dados via internet, é uma característica crucial do 5G que viabiliza esse tipo de operação, uma vez que não há atraso na comunicação com a rede.
“O 5G tem um papel de intermediário, que tem tecnologias transformadoras sobre si. É o caso da inteligência artificial aplicada ao tratamento de imagem, com processamento feito por computação em nuvem”, afirma Leonardo Capdeville, diretor de inovação tecnológica da TIM. O acordo de fornecimento de tecnologia para a montadora ainda não foi fechado.
A montadora diz ter identificado diversos cenários de uso para a nova geração de internet móvel, que trarão uma transformação para o seu processo produtivo, algo que excede o qualquer valor seja investido nessa modernização.
“O 5G é uma tecnologia de transmissão de dados com alta capacidade e velocidade, que é a base para a conectividade não apenas entre pessoas, mas principalmente entre coisas — máquinas, equipamentos, dispositivos, veículos. É o suporte para um salto sem precedentes na manufatura, integrando homem-máquina-dados. É uma transformação de alto impacto, que acelera a internet das coisas, a inteligência artificial e outras tecnologias emergentes, criando possibilidades de aplicação quase ilimitadas”, diz Souza.