Teto de gastos sozinho não aguenta, é preciso reforçar o lado fiscal, diz Armínio Fraga

Teto de gastos sozinho não aguenta, é preciso reforçar o lado fiscal, diz Armínio Fraga

dezembro 7, 2020 Off Por JJ

SÃO PAULO – Apesar das oportunidades que se apresentam para o Brasil neste momento, a questão fiscal ainda é um dos fatores que mais preocupa e faltam elementos para que sustentar a situação, segundo o ex-presidente do Banco Central e fundador da Gávea Investimentos, Armínio Fraga.

Em participação no evento Brasil 2021 em Debate, realizado pela XP Investimentos, o economista apontou que o teto de gastos é uma âncora fiscal para o País, mas que só isso não será suficiente. Segundo ele, a dívida continuará crescendo mesmo com o teto atual e o governo não irá aguentar.

“O Brasil tem uma âncora com o teto de gastos, mas eu diria que é insuficiente se não for reforçada […] O governo vai ter que aprovar reformas, mas vejo o Congresso mais reativo do que ativo neste momento. É um instinto de sobrevivência e não é o ideal. É preciso reforçar o lado fiscal”, disse Armínio.

Além disso, ele citou mais duas frentes que deveriam ser o foco do trabalho do governo: as reformas tributária e de estado. Para o economista, a primeira é a mais difícil, enquanto a segunda tem grandes oportunidades, já que o Estado no Brasil é grande, mas tem muitos gastos que não deveria ter.

Armínio destacou ainda que é preciso trabalhar a questão da desigualdade no Brasil, um fator que inclusive, segundo ele, conversa com a questão política.

Para o economista, as desigualdades, não apenas econômica, tornam o País um terreno fértil para o populismo. “As pessoas precisam acreditar que elas têm uma chance, principalmente de oportunidade”, afirmou.

Além disso, ele disse que vê um cenário de curto prazo mais complicado, com divisões dentro do governo que atrapalham o trabalho que precisa ser feito.

“Vejo o ambiente político difícil no curto prazo. Vejo inconsistências no quadro de agenda, de visão do mundo nas lideranças do governo. Algumas têm cabeça mais liberal, outras não. Por isso, vejo o Brasil se defendendo: ou seja, algumas reformas acontecem, mas o caminho será difícil até 2022”, explicou.

O interno pesa mais que o exterior

Armínio ressaltou em sua fala que vê um cenário que ajuda o Brasil, principalmente agora com o andamento das vacinas contra o novo coronavírus, mas que isso é algo que já vimos outras vezes: um país que se beneficia dos momentos de abundância de capital no mundo, mas fica vulnerável quando esse cenário se reverte.

“Temos questões de natureza fundamental que são maiores que os ventos que sopram de fora. A questão fiscal, a necessidade de ganho de produtividade e as incertezas. As preocupações são mais internas do que externas”, explicou.

Diante disso, o economista ressaltou as oportunidades que existem em infraestrutura no País. “Hoje a infraestrutura do Brasil é uma barreira ao crescimento […] E eu acho que deveria ser uma locomotiva ao crescimento”, disse.

Segundo ele, há um grande espaço de investimento no setor, mas é preciso ajustar as “regras do jogo” para ser possível para o mercado apostar nele.

Ele acredita que, junto com o agronegócio e saúde, este é um dos setores mais promissores do País hoje, mas é preciso fazer as coisas da maneira certa. Armínio aponta que é preciso pensar no longo prazo.

O risco da euforia

Por fim, Armínio ainda apontou que vê as questões monetária e fiscal no mundo como algo perigoso, e que o bom momento atual pode enganar os desavisados. “É gostoso quando as coisas estão andando”, brincou.

Ele citou o caso do Federal Reserve (o Banco Central dos Estados Unidos), que está com um viés expansionista. Isso leva a um cenário de maior tolerância com a inflação e com a questão fiscal, já que com os juros baixos por mais tempo, se pensa que é possível carregar a dívida por um tempo maior também.

“Do ponto de vista de gestão de risco, esse sistema parece uma fábrica de bolha e de fragilidade”, alertou. “Ele exige uma reação da economia real para validar o que está aí de preço”.

Segundo Armínio, as pessoas parecem “um pouco anestesiadas” com esse sistema, mas que até por experiências passadas como brasileiro, isso deixa ele bastante cauteloso.

“Vai indo, enquanto a música estiver tocando está bom, mas vai com cuidado […] É um uso exagerado de esteroide e cortisona no paciente. Isso não me agrada”, concluiu.

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