8 em cada 10 empresas que ocupam escritórios de alto padrão devem retomar o trabalho presencial até o fim de 2020
outubro 19, 2020
SÃO PAULO – A pandemia transformou a dinâmica de muitas empresas que tiveram que migrar para o home office, devido às medidas de isolamento social. Se em um primeiro momento, muito se discutia a devolução de escritórios e um novo mercado de trabalho à distância, passados alguns meses de pandemia a percepção já é diferente: 84% das empresas que ocupam escritórios de alto padrão já retornaram gradualmente ou pretendem retornar até o fim deste ano aos seus espaços físicos.
Além disso, 59% delas não têm intenção de reduzir ou não conseguem afirmar ainda se reduzirão o tamanho de seus escritórios futuramente.
Os dados fazem parte de um estudo enviado com exclusividade ao InfoMoney pela consultoria imobiliária Cushman&Wakefield, que presta serviços para empresas que alugam espaços em edifícios de alto padrão.
O estudo, que mostra o patamar de retomada na ocupação dos escritórios pelas empresas em São Paulo e Rio de Janeiro, entrevistou, em julho, 158 executivos, que estão à frente de empresas de diferentes setores, que possuem entre 100 e cinco mil funcionários e ocupam áreas de escritórios que vão de 250 metros quadrados a 5 mil metros quadrados.
Para Jadson Andrade, head de inteligência de mercado da Cushman & Wakefield, os resultados foram surpreendentes e mostram a consolidação do modelo híbrido de trabalho.
“A retomada gradual na ocupação dos escritórios e a intenção de não reduzir o espaço ocupado foram dados inesperados. O que já podemos dizer é que o modelo híbrido veio para ficar. Acho que as empresas estão finalmente encontrando um equilíbrio entre os dois mundos – ou pelo menos querem encontrar – e aos poucos estão voltando aos espaços físicos, revezando os times e organizando uma nova rotina”, avalia.
De acordo com a pesquisa, 56% dos entrevistados informaram que suas empresas não adotavam o home office, mas passaram a adotar na pandemia e manterão um modelo híbrido daqui para frente.
O levantamento mostrou ainda que, para 41% dos executivos, o modelo à distância não afetou a produtividade de seus funcionários. E outros 27% afirmaram que houve um aumento da produtividade em suas empresas.
Lajes corporativas
Nesse cenário de consolidação do modelo híbrido, Andrade avalia que as lajes corporativas, ou escritórios de alto padrão, têm potencial de crescimento, mesmo após terem sido penalizadas neste ano devido à adoção do home office e à crise.
“A demanda por escritórios continuará latente, sobretudo porque as empresas utilizam do espaço como local de criatividade entre suas equipes, troca de experiências, melhores práticas e oferecem assistência aos recém-chegados com pouca vivência profissional. Os altos investimentos na construção de novos empreendimentos certamente demonstram a confiança dos investidores com o cenário de longo prazo”, diz Andrade.
Alguns CEOs, como Satya Nadella, da Microsoft, compartilharam suas preocupações sobre estar longe do escritório por muito tempo (veja mais aqui).
Por outro lado, uma reportagem da revista britânica The Economist, que reuniu algumas das principais pesquisas globais sobre as mudanças que a pandemia provocou no mercado de trabalho, mostra que diversas empresas já adotaram o home office permanente e que os escritórios comerciais terão que ser remodelados para se adaptar a um mundo que caminha cada vez mais para o trabalho à distância e para aprimorar a experiência do trabalho remoto.
A pesquisa da Cushman mostra que 44% dos entrevistados esperam que seus negócios voltem a crescer até o fim de 2020, e outros 32% aguardam a retomada do crescimento até o fim de 2021.
“Esse movimento indica o otimismo e uma expectativa de que nos próximos meses e, ao longo do ano que vem, a situação sanitária e o ambiente de negócios melhorem. Ou seja, com uma retomada concreta da economia, as empresas podem voltar a operar a todo vapor, voltar a contratar e, no limite, poderão crescer e precisarão ampliar seus espaços”, diz.
Ocupação de escritórios
Outro fator que pode mostrar esse potencial dos escritórios é o crescimento do apetite por novas áreas corporativas durante a pandemia.
Entre março e julho deste ano, os edifícios das classes A e B (alto padrão), localizados nas principais regiões de negócios de São Paulo, registraram uma absorção líquida positiva (quando as empresas ocupam fisicamente os escritórios) de 40 mil metros quadrados, o que significa uma alta de 68% na ocupação de lajes corporativas na comparação com o mesmo período de 2019 – o movimento também é gradual devido à pandemia.
Como a consultoria é especializada em edifícios de alto padrão, o estudo pode trazer uma visão mais otimista do mercado de lajes corporativas. Isso porque empresas de grande porte foram menos afetadas do que as pequenas empresas durante a pandemia, portanto a desocupação de escritórios classe A e B pode ter sido relativamente menor.
Do total de entrevistados na pesquisa, 64% não tinham planos de expansão pré-pandemia. Dos outros 36% que tinham a intenção de expandir seus espaços físicos, a maioria (23%) informou que interrompeu o projeto em meio à crise e apenas 13% mantiveram o plano de crescimento com locação e/ou obra.
Desse grupo que não interrompeu os planos, 71% tiveram expansões de até 20% no tamanho do escritório na comparação com os seus espaços pré-pandemia. E outros 20% aumentaram entre 21% e 40% suas áreas na mesma base de comparação.
Entre os que responderam ter interrompido o plano de expansão, 64% afirmaram que tiveram que tomar essa decisão devido a outros motivos não relacionados à adoção do home office.
Por isso, na visão de Andrade, a adoção do home office não significa o fim dos escritórios ou do ambiente de trabalho físico. “Dos entrevistados, 91% afirmaram ter sofrido algum impacto econômico devido à crise sanitária e acredito que essa tenha sido a principal razão das empresas que devolveram escritórios terem tomado essa ação – e não o novo modelo à distância como era possível supor meses atrás”, diz.
Distanciamento
Andrade ressalta também que, com os protocolos de segurança e de distanciamento, o mesmo espaço que as empresas tinham antes, hoje comporta menos profissionais trabalhando juntos. Segundo ele, a tendência daqui para frente é que o adensamento nos escritórios diminua – o que pode exigir mais espaço físico a fim de cumprir as regras de segurança.
“Segundo as normas da cidade de São Paulo hoje é necessário no mínimo 7 metros quadrados para cada pessoa em locais administrativos, contudo com o novo modelo proposto, esta área pode chegar a 10m², criando assim uma maior demanda de espaços para acomodar com mais segurança os colaboradores”, explica Andrade.
Cerca de 40% dos entrevistados afirmaram que possuem atualmente acima de 9 metros quadrados por funcionário em seus escritórios.
Escritórios devolvidos
Ainda que os dados da consultoria mostrem que o impacto nos escritórios de alto padrão foi menos danoso do que se previa, de fato algumas empresas tiveram que devolver imóveis, sobretudo aquelas que tiveram problemas financeiros mais graves e demitiram funcionários ou reduziram o tamanho do negócio em decorrência da crise.
Segundo Andrade, naturalmente, os impactos econômicos forçaram algumas empresas a tomar atitudes mais drásticas – como devolver boa parte de seus escritórios no auge da crise por não enxergar outras soluções.
Recentemente, Carlos Martins, sócio e gestor responsável por fundos imobiliários na Kinea Investimentos, afirmou em entrevista ao InfoMoney que “setores com uma retomada mais lenta, que entraram no modo de ‘sobrevivência’, ainda podem mandar a equipe embora”, então, no curto prazo, algumas empresas como as do segmento de serviços podem ficar menores – e consequentemente reduzir seus espaços físicos.
Mas Andrade explica que a devolução de lajes corporativas pode ser muito custosa e é mais um alerta para as empresas que estão considerando essa opção a fim de reduzir custos e apostando no home office como modelo definitivo.
“Houve uma euforia inicial. Um novo modelo à distância estava dando tão certo em tão pouco tempo que a devolução do espaço físico, que poderia implicar em corte de custos no meio de uma crise, pareceu razoável. Algumas empresas podem, de fato, ter devolvido espaços. Mas esse tipo de movimento precisa de planejamento para não se tornar um erro”, diz.
Para ele, parte das empresas que devolveram seus escritórios não levaram em conta a possibilidade de que poderiam voltar a crescer em 2021, por exemplo, e podem encontrar dificuldade em reaver o espaço no ano que vem.
“A tendência é que o preço das lajes corporativas continue subindo daqui para frente em São Paulo. E de maneira geral, nos centros de negócios a taxa de vacância é bem baixa, tanto em SP, como no Rio. São áreas muito concorridas. Abrir mão de uma localidade, como a Avenida Paulista, por exemplo, pode ser arriscado porque recuperar esse escritório pode não ser possível daqui seis meses ou um ano”, avalia.
Ele ressalta algumas despesas do processo de devolução. “Entregar o espaço antes do fim do contrato, que dura uma média de cinco anos no Brasil, tem custos, como a uma multa pela rescisão, custos de desocupação, que incluem a remoção de mobília e readequação da área para entrega, além do aviso prévio antes da devolução. Fora o novo custo de ocupação da área previamente devolvida ou de uma nova área, caso a empresa queira ampliar seu espaço novamente”, diz.